29 de ago. de 2011

Os ipês florescem em agosto


Quem mora no interior de São Paulo sabe: agosto é mês de muito, muito vento e tempo seco. A irmã chuva, companheira de longos meses, anda ausente, semeando outras terras. Enquanto isso, nosso irmão vento varre  varandas e calçadas, balança as roupas no varal, enche as ruas de folhas secas. O céu, de um azul fundo, parece dizer: paciência, paciência, a primavera, em sua sabedoria, trará de volta a chuva tão aguardada. E o vento traz com ele, os papagaios coloridos dos meninos,  que enchem o entardecer, disputando o espaço com os poucos passarinhos que ficaram para passar o inverno.Coloridos, bailam elegantes no azul arroxeado das tardes, pedacinhos travessos de uma infância risonha, numa paleta de sedas flutuantes, guerreando pacíficas no céu...Quem é que se lembra de conflitos na Líbia, ou se preocupa se o etanol subiu de novo, diante de um  céu assim salpicado de alegria? Que importância tem os índices de inflação ou a crise financeira americana quando há papagaios para ser empinados?
Agosto também nos traz os ipês em flor. Amarelos, rosas, brancos, roxos, disputam com os papagaios do céu o privilegio de iluminar a tristeza do final do inverno, prenunciando uma primavera adormecida prestes a ser despertada. As calçadas se vestem do dourado de suas pétalas e as praças do branco fugaz de suas copas.Uma florada de ipês dura quatro, cinco dias no máximo, numa rapidez estonteante de cores, que  os mais apressados deixam de perceber. Parece-me que para alguns, as paisagens são apenas um pano de fundo para a correira insana da vida...Mas os ipês, alheios ao desespero humano, continuam seu ciclo eterno, enfeitados pelas mãos sábias do Criador. De repente é assim, a árvore totalmente seca, de galhos magros como os meninos dos papagaios mirando o céu, se enche de uma vida exuberante,  uma chuva de ouro e prata salpicando as calçadas e praças.

Vejo os papagaios no ceu, livres e leves e as flores nos ipês, etéreas e passageiras, desprendendo-se dos galhos e cobrindo as ruas... ambos- papagaios e flores- se deixam levar pelo ciclo da vida, carregados pelo vento de agosto. Olho para eles e me dou conta da lição intuída: é preciso saborear o vento, deixar -se por ele levar, soltos no ar como os papagaios coloridos dos meninos da minha terra, sem peso, sem bagagem, porque a vida é como as flores dos ipês de agosto: delicada, preciosa e fugaz...